quarta-feira, 25 de abril de 2012

The long and winding road



The long and winding road

Marcos Bayer

Talvez a mais significativa das letras cantadas nas músicas dos Beatles. É a eterna esperança de quem sozinho ao desabrigo sabia da existência de uma longa e sinuosa estrada que levava à sua porta. The long and winding road that leads to your door. A estrada é a vida de cada um deles, jovens, rebeldes, criativos, talentosos e humanos que sofreram as dificuldades e resistências de todos os inícios, o reconhecimento, a glória, as perdas e a morte. Dois sobreviventes, Paul Mc Cartney e Ringo Star. Paul, pelo cuidado e pelo talento é o cavaleiro andante de uma geração que protestou, alertou, mudou comportamentos no Ocidente, ousou e cantou um sonho multicor. Foram debochados quando necessário, como durante o recebimento da comenda entregue pela rainha, quando teriam dito: os mais pobres podem aplaudir, os outros devem chacoalhar suas jóias. Anos depois, John Lennon devolveu ao Palácio de Buckingham a comenda com um singelo bilhete: “Em razão das interferências do Reino Unido em questões bélicas internacionais, Vietnam inclusive, devolvo a condecoração. With love, John Lennon”. Sempre foi o mais político, o que tinha maior alcance do significado do grupo. Não por acaso passou um final de semana na cama, com sua mulher, em protesto contra as guerras. Deixaram-se fotografar nus. Nothing to hide or fear.
Suas músicas vão desde o pedido de socorro, “help to get my feet back on the ground” até “all you need is love”. São canções que todos entendemos e acolhemos. “And anytime if you feel the pain, Hey Jude refrain, don’t carry the world upon your shoulders”. E assim, entre acordes e gestos, entre Londres e Nova York, eles concluem que “we all live in a yellow submarine”.
O que importa nesta banda é que influenciaram gerações inteiras. Um fato político inusitado, em escala quase global. Só não foi maior porque a comunicação mundial era limitada.
O que restou, hoje, é uma histeria quase acrobática. Uma sociedade fria e automatizada, conectada e alienada simultaneamente. Uma sociedade vencida pela violência, pela corrupção, pela mediocridade. Uma sociedade média. Da média e para a média. Sem referências ou reverências.
Uma sociedade estética e siliconada. Punk, marombada, have, trash, funk, fugaz, midiática, blogada, pulverizada, dispersa e aspergida dentro de si.
Uma sociedade global que assiste ao levante do Oriente, a China.
Ya, ya, ya. She loves you, ya, ya, ya. She loves you, ya, ya, ya.
Uma sociedade que pulsa em bytes, megabytes e mede eficiências inconscientemente. Quantos orgarmos por hora recomendam as tabelas da medicina quântica? Ela existe? Quem? A tabela ou a medicina?
“Something in the way she moves, atracts me like no other lover, something in the way she woos me...”.
A sociedade pós-beatles não é um sonho realizado. É uma sociedade funcional, métrica e digital. Não por acaso, prevendo, John Lennon disse: The dream is over.
Eles fizeram sua parte. Foram alma, deram ânima.
Anima, vagula, blândula. Pequena alma terna e flutuante. Hóspede e companheira do meu corpo. Vais descer aos lugares pálidos, duros e nus. Onde deverás renunciar aos jogos de outrora, como escreveu Adriano pelas mãos de Marguerite Yourcenar.
Imagine all the people living life in peace. Ou, ainda antes, “all we are saying is give peace a chance”, como queria John Lennon.
De que paz falava? Apenas da guerra arrazadora? Ou de fatias sociais que se sobrepunham umas às outras, pelo regime econômico adotado, capitalista ou comunista, mas que inexoravelmente, ambos, proporcionavam mais para uns poucos do que para outros muitos.
Ou era o fim do sonho jovem que cederia às vontades do patrão ou do chefe e que, no silêncio da resignação, teria que renunciar ao próprio sonho de reformar o mundo? Ou era, ainda, o sonho que um negro e presidiário, Nelson Mandela, conseguiu manter circulando em seu sangue até a dia da libertação final e com ela fez-se líder político de uma sociedade que não renunciou ao desejo do homem livre?
De que sonhos falamos? “Obladi and Obladá, life goes on bra...Desmond says to Molly, girl I like your face. And Molly says this as she takes him by the hand...”.
Foram todos os quatro artíficies de seu tempo. Foram líderes de processos diversos. Criativos, decorativos, polêmicos, proibidos ou condecorados.
Foram uma belíssima marca do século XX.
George Harrison, o mais inquisitivo, foi em busca de Deus.
My sweet Lord...
MMM My Lord...
Sweet Lord...
Paul Mc Cartney canta em Florianópolis...
Lord, my sweet Lord...
MMM My Lord...

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Universo






Universo

Marcos Bayer

Olhem para o céu estrelado, sem luz ao redor, aqui da Terra. Lá está o firmamento e nele inúmeras e incontáveis estrelas que compõem o Universo. Explicações sobre o nascimento do nosso planeta existem para satisfazer todas as necessidades. Desde a grande explosão até a criação divina. Caminhando pela lógica e pelas informações disponíveis, este planeta criou condições para a existência de vida. Mineral, vegetal e animal. Antes do homo sapiens, não sabemos quando, houve um momento em que não havia linguagem. Eram olhares, gritos e urros, gestos e carícias. Provavelmente.

Com o surgimento da fala, aumenta a comunicação. Explicações, perguntas, teses e conceitos. As religiões surgem e são modeladas. Com elas as diversas teorias para a origem de tudo. Logo, já ocupava a mente humana o que viria, com o tempo, a ser explicitado nas sagradas escrituras de todas as origens. A palavra escrita é a gênese dos códigos.

Criamos nossos mitos, semideuses e um Deus – Theos – Zeus e tantas outras formas de expressão linguística. Ele criou tudo.

Na impossibilidade de compreender o Universo, houve a necessidade de criar a hipótese de um criador. O homem sabia que não era sua obra.

Ao criador tudo foi atribuído. E com a passagem do tempo, usando a curiosidade e inteligência, fomos explicando fenômenos, compreendendo regras, expressando sentimentos e caminhando em direção àquilo que chamamos de evolução.

Além da memória genética de cada ser humano, a medicina admite a hipótese da memória psicoemocional. Portanto, se verdadeiro, todos nós estivemos em vários lugares de um passado remoto. Nós somos a vida eterna e nossos descendentes a certeza da perenidade.

As ciências e as artes, dois ramos da mesma árvore, são a expressão da capacidade humana no tempo. Da fogueira às micro-ondas. Das inscrições rupestres às telas de Dali, por exemplo, que tanto brinca com a ideia de Chronos, aquele que cronometra. Kairós, seu filho, o que procura a conexão com o Universo para tentar compreender sua existência. A oportunidade da vida.

Estes dois deuses, Chronos e Kairós, são prova incontestável da necessidade humana de estabelecer um tempo para fazer e outro para sentir. Grande engano da chamada Revolução Industrial quando conseguiu seccionar o ser humano. Para o homem medieval fazer e sentir eram indissociáveis. Como o pensamento é indivisível. Como indivisível é o homem. Eros ou Tanatos. Vida ou Morte.

Também podemos admitir que a máxima “Tu és pó e ao pó voltarás”, mesmo sendo parte do cristianismo, é absolutamente ecológica e autossustentável. Antes dos crematórios no Ocidente, a prática já ocorria em pontos do Oriente. E nossa decomposição carnal nos remete de volta a terra, ao chão, ao solo.

Gaia, a Terra, é um organismo vivo. Sofre cortes, impactos e maus tratos. Mas, recupera-se. Modifica-se e altera-se.

A única conexão possível do homem com outras dimensões é o mergulho no Universo. Não sabemos como.

Mas, a mesma inteligência que organiza o contexto universal é a que organiza a mente individual. Uma é fragmento da outra. O mundo externo é tão vasto quanto o mundo interno. Num exemplo rudimentar, a influência da Lua nas marés. Aqui e lá. Fora e dentro.

Esta conexão nós perseguimos ao longo da evolução. Ela, a conexão, aparece nas artes e nas ciências. A mais significativa para nós ocidentais é o toque divino de Michelangelo na Capela Sistina.

Tudo o que já sabemos, o chamado conhecimento humano acumulado, agora disponível na www (world wide web), reflete a ligação entre os dois universos: interno e externo. O da mente e o do cosmos.

É possível que eles se revelem simultaneamente. Para dentro e para fora.

Então, nós compreenderíamos que há um único verso. Uni verso.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Us and them


Wind and leaves...



Dimensões e tempos

Marcos Bayer

E desde os primeiros tempos o homem havia que se submeter ao tempo. Um tempo para plantar, um tempo para colher. A gestação de uma mulher, de um animal e o tempo para chocar o ovo da águia ou da serpente. Durante anos houve a submissão ao tempo e às dimensões. Todo o período chamado de revolução agrícola foi marcado pela espera do tempo. As estações do ano, as temperaturas equivalentes, a germinação, floração, crescimento e colheita. Não se podia intervir no clima, mas aceita-lo e ou criar formas rudimentares de proteção. O tempo era senhor dos nossos destinos. Guerras foram calculadas em razão dos movimentos climáticos do tempo.

A velocidade era a determinação dos passos, da potência da tração dos animais, dos músculos dos remadores ou da força dos ventos.

Arte e Ciência, embora dividas na Grécia antiga, foram reaglutinadas nas construções góticas do século XIV. Entenderam os arquitetos de então que uma dependia da outra. O cálculo suportava a forma. E o Renascimento festejou em sua plenitude esta feliz ideia entre dois conceitos com a mesma gênese.

A Revolução Industrial inicia uma dissociação entre dimensão e tempo, entre arte e ciência. Até a chegada da revolução digital, assistimos avanços nos métodos produtivos e, simultaneamente, a aceleração do tempo aliado às modificações genéticas. Frangos podem ser abatidos em 40 dias. Um século antes esperavam 180 dias pelo abate.

A era virtual acelera o tempo numa explosão de informações, aceleração total em todas as formas de comunicação, oferecendo ao homem o anonimato, o distanciamento físico e a submissão muda aos comandos dos sistemas operacionais.

Os sistemas não leem emoções nem respondem aos sentimentos.

Observar a queda das folhas e a mudança da coloração nas árvores não tem mais sentido.

Na tela do computador temos todas as florestas do planeta e um zilhão de fotografias.

No filme American Beauty, 1999, de Sam Mendes e Allan Ball, há uma cena sobre a dimensão e o tempo, cuja percepção foi perdida nas ultimas décadas.

A aldeia global de Mc Luhan (1911-1980) e 2001 - Uma Odisséia no Espaço (1968) de Stanley Kubrick foram antecipações fenomenais da relação do Homem com o binômio: dimensão e tempo.

Não nos cabe julgar o caminho do homem. Ele será, inexoravelmente, o que conseguir ser. Mas, todas as condições objetivas para a percepção das novas relações com a dimensão e o tempo já são perceptíveis.

Em sua essência será sempre o mesmo homem. Com capacidades sensoriais infinitas.

Apenas o afastamento da Natureza será maior. A própria Natureza será modificada, em parte aniquilada, como se observa.

Teremos especialistas cada vez mais específicos. Especifistas, eu diria. Teremos mais pressa. A política refletirá este novo homem moderno, ágil, pragmático como os funcionários dos bancos obrigados às metas diárias de captação financeira. Este novo tipo de ladrão que vemos todos os dias nos telejornais. Os que roubam em nome da nação. A política é sempre o reflexo de uma sociedade.

Conseguimos criar uma sociedade planetária lastreada na eficiência, eficácia, produtividade e outros conceitos cuja visão imediata é a produção aumentada. Contudo, a consequência é a desorientação absoluta sobre a condição humana.

Estamos concebendo incontáveis sistemas de exploração social. Desde o sistema público de saúde até os sistemas previdenciários. Estamos usando, com uma competência invejável, a dimensão virtual para aprisionar o homem dentro de sua própria mente...

A liberdade será restrita ao teclado cuja consequência última poderá ser o Universo.

E todos se acreditarão livres...

domingo, 1 de abril de 2012

Demóstenes




Demóstenes: o grego e o goiano

Marcos Bayer

Demóstenes, o grego, é descrito nos registros históricos como um grande orador que venceu a gagueira com exercícios declamatórios de poesia e treinos de fala com seixos na boca enquanto corria nas praias da Grécia. Vencida a deficiência, tornou-se um dos maiores oradores e político de sua época. Conclamou seus concidadãos, de forma veemente, à luta contra Felipe II da Macedônia, para evitar a invasão sobre Athenas.

Vencidos e ocupados, inclusive por Alexandre herdeiro de Felipe, Demóstenes e outros gregos sofreram as consequências da derrota bélica e política. Teria comprado sua fuga por intermédio de um ministro macedônico e condenado em razão dela. Após a morte de Alexandre, retorna às suas atividades. Fracassa na revolta contra outra liderança grega e, então, se refugia na Ilha de Poros, onde comete suicídio quando percebe que está cercado por soldados adversários.

Se for verdade, é uma tragédia para um grande político e orador que venceu diversos obstáculos incluindo a recuperação parcial da fortuna herdada de seu pai, aos sete anos, surrupiada por seus tutores.

Seu crime teria sido a compra da fuga. Isto era uma desonra para os padrões da civilização helênica onde semideuses e homens foram mais próximos de Zeus do que nós das estrelas.

Demóstenes, o goiano, estuda Direito e ingressa, por concurso, no Ministério Público de seu estado e a ocupa o cargo de Procurador Geral da instituição. Depois passa a ser o Secretário de Segurança Pública e chega ao Senado Federal em 2002.

Normalmente, os que procuram o Direito e depois o Ministério Público, a Magistratura ou mesmo a Advocacia, sentem alguma vocação para a promoção da Justiça. Ao longo do caminho, algumas pedras, não na boca como para o grego, provocam mudança de rota pessoal. Mas, há exemplos de homens que pautaram seus atos pela baliza da justiça e conseguiram chegar às colinas da visibilidade e admiração pública. Abraham Lincoln, por exemplo.

Por enquanto não se conhece a defesa de Demóstenes, o goiano.

Sabe-se, contudo, que a acusação não é compra de sua fuga de Brasília.

Tanto o grego como o goiano, ensinam a oratória, o exercício da política e a contribuição de Athenas para o mundo, hoje uma sociedade expandida e global. A Polis Kosmos de 2012.

Aceitando que a educação do homem é feita pelo ensino, pelo esforço e pelo exemplo, o país espera pelas palavras do senador.