quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Dopamina, a grande heroína da História!







Dopamina, a grande heroína da História!

Marcos Bayer

Diz o médico que a dopamina está impregnada em nossas cabeças há muito tempo. Milênios. Ela é a responsável pelas sensações de bem estar nos seres humanos. Lá nos primórdios, as tarefas essenciais ao homem eram três: (1) garantir a procriação e a preservação da espécie através do ato sexual e suas decorrências de carícias e afetos, (2) a luta pela sobrevivência abatendo a caça e ou capturando o pescado, (3) saciar a fome e a sede.
Nas três tarefas citadas, a dopamina atua diretamente na memória, no movimento e no prazer.
Da procriação da espécie chegamos às concepções sobre o amor ao longo da História. E o amor é objeto de busca dos humanos, pois ele tem diferentes significados, entre eles a parceria, cumplicidade, desejo e segurança emocional. É uma forma de reconhecimento, logo de prazer e bem estar. Haja dopamina. (1)
A luta pela sobrevivência é o trabalho diário. Seja matar o javali de outrora, seja criar a ovelha, o frango ou o suíno de agora. Seja plantando as hortaliças ou as árvores frutíferas. É a tecelagem, é a tinta na tela, a bota de couro, o anel de ouro, a impressão do livro, a lição na escola, o toque na viola, o cantar e dançar no sertão. O homem medieval era assim, múltiplo funcional. Construía sua própria casa com ajuda do vizinho, e tinha ao longo do dia diversas tarefas sempre interagindo com a Natureza. Desde a produção do mel ao queijo a granel. Sabia olhar para o céu e prever a chuva ou o vendaval.
A Revolução Industrial (1826), quando a primeira viagem de trem é feita entre Manchester e Liverpool, introduz, no Reino Unido, mudanças radicais na vida social.
A fábrica isola o local da produção, define o produto, equaliza habilidades, abafa a criatividade e cria como recompensa as férias, o salário, o plano de saúde, a carreira profissional e a aposentadoria. Em 2026, duzentos anos depois, o Uber já sinaliza, nada disto existirá. O trabalhador somente terá a participação nos lucros da empresa.
Ou seja, em cada afretamento realizado o motorista ganhará 20%, por exemplo, do lucro da empresa e nada mais. Férias, salários, planos de saúde, seguro de vida e aposentadoria serão aspectos do mundo mecânico, o mundo industrial. Haja mais dopamina. (2)
No exercício da profissão obtemos reconhecimento, recompensa pecuniária e, de novo, o prazer e o bem estar. Mas, nem todos conseguem esta satisfação, pois o homem medieval - multi funcional foi se transformando num homem uni profissional e industrial.
Não por acaso os que fazem e contribuem para transformações históricas são pessoas multi funcionais. Pela inquietação, curiosidade e impaciência.
A mesma Revolução Industrial que precisou e precisa preparar mão de obra específica para as exigências do mercado tratou de burocratizar a Universidade. O que já foi um local de estudos universais, universitas, transformou-se numa empresa de expedição de diplomas.
Na idade média, quando o aprendiz de qualquer profissão, sapateiro, por exemplo, mostrava ser capaz de fazer um sapato como fazia seu mestre, era chamado a ajoelhar-se perante este, e por ele recebia o toque da espada, de ombro a ombro, passando sobre a cabeça, para então ser reconhecido como mestre naquela arte ou ofício. O fazer era parte do saber.
Hoje, na academia, alguns escrevem de 500 a 1.000 páginas, citam outros 100 ou 300 autores para obterem o título de doutor. E obtém. E, o que é pior, acreditam que são doutores.
Sócrates, Platão, Aristóteles, Leonardo Da Vinci, Fernando Pessoa ou Charles Chaplin, não precisaram citar ninguém para presentearem o mundo com suas obras. Tampouco Picasso, Dali ou Miró.
Conhecimento é intuição, observação, experimentação e, eventualmente, comprovação.
O alfabeto tem 26 letras, são sete as notas musicais e sete as cores na refração do prisma, além de dez dígitos numéricos. Isto quase todos sabem. O problema é como organizar as 26 letras na literatura, as sete notas musicais nas canções e as sete cores na pintura. A capa do long play do Pink Floyd é genial por isto. The Dark side of the Moon (1973), mostra as sete cores do prisma e as sete notas musicais. É aula de saber.
Ao saciar a fome e a sede, a dopamina responde imediatamente. A tal ponto que pode inebriar, provocando a sensação de relaxamento tão forte a ponto de induzir ao sono. Os alimentos industrializados, empacotados ou engarrafados, modificam nossa percepção em relação à alimentação.
Lá nos primórdios, dizem algumas teorias, quando estávamos na África e nosso sangue era do tipo O negativo, éramos coletores e caçadores. Éramos nômades. Esgotávamos os recursos naturais numa determinada área e seguíamos para a próxima. Atléticos, corríamos e andávamos mais. Ou para correr do leão ou para abater o búfalo.
Com a descoberta do trigo, sua manipulação com água e sal, fizemos o pão. E, então, a vida passou a ser mais acomodada. Sentamos por mais tempo. Sedentárias formaram-se novas povoações. Mais dopamina.
A agricultura e a domesticação de animais ajudaram na construção das vilas, futuros burgos, consequentes cidades. Novos tipos sanguíneos surgiram e do pão fez-se a massa e com ela a química humana identificou os carbo-hidratos. Mais dopamina, mais bem estar. Mais desenvolvimento cerebral, mais necessidade de recompensa cerebral.
Trabalho, sexo e alimentação são matrizes inerentes, lógicas, necessárias e inevitáveis na caminhada humana. Delas derivam o mundo subjetivo e dele surgem a fé, o amor, a honra, a dignidade e a política que vai organizar o complexo jogo da vida humana associada.
Em todas estas atividades humanas está presente a dopamina. E quando ela não está, as consequências são terríveis. A dopamina é o combustível da vida humana plena. Sem dopamina, instala-se a depressão e outras deficiências psico-neuro-emocionais.
Com a chamada modernidade, as facilidades tecnológicas, a magnífica janela do computador, a telefonia, a cyber magia e a pornografia, a dopamina tem outras gêneses. Não são mais aquelas três fontes primárias.
Criamos uma nova patologia denominada cyber dependency.
O uso de drogas, de todos os tipos e ao longo da História, registra sem estatísticas, porém observável pela medicina, a alteração em nossos cérebros.
O cérebro humano se reorganiza e as fontes geradoras de dopamina são outras.
As drogas provocam a multiplicação da dopamina que é fonte de prazer e, portanto, são provocadoras de mais desejos e de mais quantidades para que produzam mais prazer e bem estar, indefinidamente.
É compreensível, portanto, que num mundo em que já não se sente os efeitos da dopamina da forma primitiva: (1) pela realização do trabalho como conquista e reconhecimento diário e ou (2) pela plena saciedade da fome e da sede, que o ser humano vá buscar as fontes da dopamina em outras bandas.
A dopamina é a grande heroína da História. Pelo menos até agora!






quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Escassez, Política e Ecologia.




Escassez, Política e Ecologia.

Marcos Bayer

No mundo econômico existem o lucro, o logro e o caos. As teorias econômicas relevantes são três: O liberalismo de Adam Smith (1776), o estatismo de Karl Marx (1848) e a intervenção do Estado na economia de John Maynard Keynes (1932) quando o então governador do Estado de Nova York, Franklin Delano Roosevelt, a utilizou para tirar a Bolsa de Valores da crise de 1929 e lastrear sua candidatura vitoriosa à presidência dos Estados unidos. Foi reeleito em 1936, 1940 e 1944.
Em 1950, nós éramos dois e meio bilhões de habitantes no planeta. O mundo vivia a guerra fria e as duas superpotências eram os EEUU e a URSS. A Europa estava sendo reconstruída por causa da destruição da Segunda Grande Guerra e a cortina de ferro estava sendo pendurada. O Vostok só iria levar Gagarin ao espaço em Abril de 1961, Neil Armstrong só pisaria na Lua em Julho de 1969, os Beatles saiam de Liverpol para o mundo e nós ainda não sabíamos o que era fast-food, um MD-11, Sky Lab, Prozac, Lap Top, Megabytes, i phone, botox, ecstasy, Bluetooth e pen drive. Muito menos armazenar na Cloud. Nuvem até então, ou estava no céu ou na cabeça do menino que vivia no mundo da Lua.
O poder político gira em torno das três teorias econômicas acima, criando algumas variações, como o capitalismo de Estado na China moderna, mas nada fora desta lógica triangular.
Em alguns países a prática política é mais ou menos decente. Depende. Países em que a liberdade de imprensa e a sociedade são mais educadas o controle é maior.
Mas, normalmente o jogo político também é um tripé. O poder político decide liberar dinheiro acumulado com sacrifício de todos através de suas instituições, o BNDEs por exemplo, para um conglomerado empresarial, a JBS por exemplo, para financiar a manutenção do grupo político no poder.
O Brasil viveu por vários anos esta trágica experiência. No dizer de Lula, desde as capitanias hereditárias. No dizer de outros, mais recentemente.
Tanto Paulo Guedes, economista e conhecedor da História da Economia, quanto Sérgio Moro, juiz e talvez jurista, sabem o exato funcionamento destas engrenagens de poder. Sob este aspecto, o governo Bolsonaro está muito bem servido. Onyx Lorenzoni, aparentemente um parlamentar com bom trânsito entre seus pares, parece que vai ter que se explicar um pouco melhor em razão das mais recentes planilhas de custos da JBS. Se convencer 100% (cem por cento) estará dentro da meta do presidente eleito.
Aqui em Santa Catarina, a JBS foi financiadora de inúmeros políticos e perdeu a quase totalidade de seus contatos. O catarinense decidiu, com fúria cívica, enterrar os que com caras de anjos sugavam recursos da sociedade com bocas de vampiros.
Sobre o novo governador eleito, muito pouco ainda se pode comentar.
Mas, voltando ao título do artigo, quase chegando ao ano 2020, vemos um mundo com sete e meio bilhões de habitantes. Aproximadamente vinte e cinco milhões de pessoas refugiadas, perambulam entre fronteiras europeias, africanas, árabes ou americanas, buscando trabalho, comida, saúde e educação, pelo menos.
Quando se discute a reforma previdenciária, no mundo inteiro, é dentro deste panorama. Mais longevidade, menos gente na ativa contribuindo para o aposentado. Isto, por si só, estimula o crescimento populacional.
Então, as chamadas carreiras de Estado, como magistratura, diplomacia, fiscais de tributos e renda, promotores, parlamentares e conselheiros de tribunais diversos se protegem atrás das leis que concebem, votam e usufruem.  Não por acaso, no Brasil, a distancia entre o salário mínimo e o salário do ministro é de quarenta vezes. Isto é no mínimo indecência moral. E é assim que o capital subjuga o trabalho. Num mundo onde há cada vez mais capital e menos trabalho. O povo brasileiro, mesmo sem escolaridade suficiente já percebe a hipocrisia dos que falam em seu nome.
Pequenas modificações no comportamento humano mostram duas tendências: (1) A passagem do mundo mecânico de Isaac Newton para o mundo do easy touch, o digital, e suas decorrências. Entre elas a eliminação de postos de trabalho em escala planetária, visto que um homem pode fazer cada vez mais. Mesmo na agricultura, um trator atual tem funções e controles que dispensam o trabalho de outros agricultores.
(2) A otimização dos espaços e custos em todas as áreas da atividade humana. Desde o Uber que ocupa assentos vazios nos automóveis, passando pelo Airbnb que ocupa camas vazias, às compras do e-commerce até às passagens das companhias aéreas que não aceitam mais reservas, mas apenas a venda imediata on-line. Os espaços de co-working são outro exemplo.
Ontem, os telejornais comentavam a abertura de um bordel operado por robôs num país da Escandinávia. Engraçada ou trágica a Inteligência artificial?
Todos estes detalhes alteram o mundo do trabalho. O trabalho humano é habilidade que constrói nossa História como também permite desenvolver ao extremo nossa personalidade. Arbeit, liebe und Gott. Trabalho, amor e Deus, dizem os alemães.
Some-se aos argumentos, o fato de que aproximadamente três bilhões de asiáticos, especialmente chineses e indianos, entraram no mercado mundial nos últimos quinze anos. Isto significa aumento da oferta de mão de obra e consequente diminuição dos valores dos salários em escala global.
Na Índia, em Bangalore, na estrada que dá acesso a maior cidade tecnológica deles, está escrito: From handicraft to cybercraft. Do artesanato à cibernética.
A saída do Reino Unido da União Europeia, mesmo tendo preservado a libra esterlina, é um fechamento de fronteiras para proteger seus súditos.
A vitória de Donald Trump significou o mesmo. Com ou sem Twitter presidencial, os norte-americanos querem de volta seus postos de trabalho.
Vivemos tempos de escassez. Será constante e contínua. Há limites no planeta. As jazidas minerais são finitas, a água potável não é bem cuidada, os espaços prediais ou territoriais, nas cidades, estão cada vez mais caros.
Em alguns países, na Espanha, por exemplo, o custo da energia do imóvel (calefação, refrigeração e iluminação) está se aproximando do custo do aluguel. Isto é outro sintoma de escassez.
Há uma disputa entre desmatar para produzir soja e milho e transformar em ração para alimentar aves e suínos e pastagem para o gado ou preservar as florestas para garantir a vida de outras espécies e a própria água.
Os processos educacionais estão em cheque. Exceto nas tradicionais escolas britânicas. Talvez, ainda, as melhores do mundo.
E no meio deste mundo tão complexo, eu escuto hoje, o ex-presidente da República do Brasil perguntar à Juíza: Doutora eu sou dono do sítio ou não? E ela disse: Isso quem tem que responder é o senhor!