terça-feira, 13 de novembro de 2007

S P Q R

Senatus Popolus Que Romanus representado pelas quatro letras do título deste artigo, e ainda hoje, gravadas em vários prédios públicos e nas tampas dos bueiros da capital italiana, resistem ao tempo e eternizam a glória das instituições daquele povo.

O Senado Romano era o símbolo do poder e a instância máxima entre os homens e Deus. Na República de Roma, até mesmo o imperador tinha que se submeter à vontade dos senadores.

Havia disputas políticas, traições e corrupção. Mas, a maioria de seus membros representava a dignidade dos cidadãos daquela época.

Ser senador era uma honra. Daí surgiu a palavra honorários, ou seja, o pagamento pelo trabalho realizado honradamente.

O Senado da República, em todas as épocas em que existiu foi sempre uma instituição respeitada e responsável pelo equilíbrio de poder dentro de qualquer governo. Nele estão os mais sábios, os mais sensatos e os mais experientes.

Mesmo aqui no Brasil, em passado não muito distante, tivemos personalidades memoráveis exercendo o mandato de senador. Homens públicos que recebiam seus honorários e trabalhavam pelos interesses da nação.

De repente, não se sabe exatamente por quais razões, o senado brasileiro virou um balcão de negócios.

Respeitando as exceções de sempre, e elas existem, nossos senadores se tornaram grandes conhecedores de genética bovina, especialistas em obras públicas, engenheiros de comunicação e mídia eletrônica.

A honra foi substituída pela ganância. A erudição e a ética foram trocadas pela safadeza.

A crise instalada dentro do Senado da República Federativa do Brasil é o retrato do caráter da maioria de nossos senadores. Uma imagem deprimente.

Aqueles que poderiam exercer a função política de guardiões de nossas instituições, que poderiam vetar atos do presidente, que poderiam censurar comportamentos dos magistrados, tornam-se figuras menores e desprovidas de qualquer autoridade moral.

Quanto vale um senador?

Uma pensão alimentar, uma bezerra desgarrada ou uma viagem ao exterior?

Na estabilidade comportamental de qualquer sociedade o exemplo tem que vir daqueles que a dirigem. Não há outra hipótese.

Ao observarmos o aumento da criminalidade e a completa subversão dos valores intrínsecos à atividade política, a mais digna das funções exercida pelos homens, deve-se perguntar se os responsáveis diretos não são nossos governantes, entre eles, nossos senadores.

Assim como o império romano ruiu por excesso de corrupção, falta de trabalho, enfraquecimento moral e crise de abastecimento, assim também, poderemos experimentar a falência total das instituições e a invasão dos bárbaros tal qual como aconteceu alguns séculos atrás.

Desconstrução

Estamos aprendendo a quantificar o movimento, chamado desenvolvimento, que aconteceu no planeta nos últimos cinqüenta anos. O primeiro fator, a triplicação da população mundial, passando de dois para seis bilhões de seres humanos.

Inegáveis avanços em todas as áreas do conhecimento, sobretudo nos transportes e comunicações. A medicina, ciência que trata da manutenção e do prolongamento da vida tornou-se mais eficiente.

A produção de bens materiais acompanhou o crescimento populacional, sem, no entanto, atingir a todos.

Os danos ambientais, decorrentes do vertiginoso crescimento populacional, da produção e do consumo estão aí, diariamente, para todos verem. Não há mais dúvidas de que somos finitos, assim como também, sabemos que não poderemos ter níveis consumo e utilização de recursos naturais iguais a determinadas sociedades, entre elas a norte-americana.

Por que então a agonia planetária?

O mercado global responde de forma diária, pragmática e incansável. O mundo está pronto, mas não há espaço para todos. Das dez milhões de famílias da classe média brasileira da década de oitenta, só restaram três milhões.

Para os recém formados na sociedade nacional, sessenta por cento das oportunidades de trabalho, pagam até três salários mínimos apenas. Apostamos num modelo de ensino privado que cobra para formar aquilo que o formado não irá receber. O mercado espreme a todos, silenciosamente.

Se pensarmos pela ótica da solidariedade humana, as grandes corporações são as instituições mais corruptas da atualidade. Elas vão se instalar onde a mão de obra é barata, onde a legislação ambiental não existe ou não é aplicada e onde há beneficio fiscal ou tributário. Quando, então, organizam um núcleo social razoável, com empregos, salários e estabilidade familiar, descobrem um novo nicho de pobreza, abandonam o local em que se instalaram e reproduzem o fenômeno. Correm atrás do lucro, ad eternum.

Como se não bastasse isso, são elas que conformam e confortam a classe política, em geral. E, exatamente aí, está o perigo da desconstrução.

O poder político fica submetido à vontade do mercado e a necessidade coletiva é relegada para outros planos.

A política deteriora-se, e com ela a sociedade.

Um exemplo clássico do que falo é o seriado “Amazônia”, mostrado recentemente pela televisão. Ali vimos o caráter de um homem de princípios e convicções, Chico Mendes, ser aniquilado pelos interesses da indústria látex.

Mas, o pior veio depois de sua morte. Seu exemplo, de lutas e consciência ambiental, foi dissolvido por algum José: Genoino ou Dirceu, pouco importa, já não faz muita diferença...


segunda-feira, 12 de novembro de 2007

The supermarket

Quando surgiu a palavra, provavelmente nos anos sessenta do século passado, foi para designar o centro de compras, coberto e climatizado, onde diversos produtos de diferentes origens podiam ser comprados pelos consumidores em geral. Para os norte-americanos, seus construtores, foi uma revolução no comportamento social. Sair de casa ou do trabalho dirigindo seus espaçosos e potentes automóveis para exercitar um novo verbo: go shopping.
E foi assim, exatamente assim, que a sociedade norte-americana invadiu o mundo ocidental. Introduzindo o conceito de supermarket. Hoje, até no Oriente este conceito conquista crescentes espaços.
Quem tem dinheiro participa desta nova sociedade de consumo. Quem não tem rouba, mata ou fica de fora. Os meios de comunicação, as mídias power, estimulam o consumo desvairado, criando conceitos como a satisfação ilimitada. Tudo agora tem que ser fashion. Não se sabe exatamente o que é isto. Mas, é importante sê-lo.
Em nome deste supermarket mudou-se a história do planeta. As tecnologias são usadas cada vez mais para incrementar o consumo desnecessário, ao invés de recuperar a sanidade ambiental.
A civilização global não sabe desfrutar aquilo que a natureza nos oferece. Ao contrário, a destrói cada vez mais rápido.
O capitalismo, sistema econômico baseado na sociedade centrada no mercado, expurga muito mais do que absorve.
Os que têm mais do que seus semelhantes isolam-se em fortalezas inexpugnáveis defendendo-se dos bárbaros: aqueles que não têm.
Não há uma intenção governamental de gerar oportunidades de trabalho e renda para os governados. Os governos, ditos modernos, seguem a mesma ética capitalista das empresas, a busca incessante pelos lucros.
Cabe então perguntar: Qual a lógica do mercado?
Diminuir para excluir ou aumentar para incluir?
O homem, perplexo, vê a ruína social e dela participa.
Primeiro criamos a sociedade descartável, agora a comunidade rejeitável.
Os que têm dinheiro e podem consumir não mais se interessam pelos outros, a não ser enquanto eles possam ser consumidores.
Para todo empreendimento faz-se a viabilidade econômica. The master plan.
Não se ouve mais falar em viabilidade humana.
A venda dos direitos de uso de cotas de carbono, o direito de comprar espaços para poder poluir em outros, e os termos de ajustamento de conduta, são dois dos mais recentes absurdos do chamado direito ambiental.
Todo o humanismo é comercializável.
O mercado criou a idéia de que não há limites para a satisfação. Talvez, e não por acaso, Mick Jagger seja um dos ícones da segunda metade do século XX, quando canta: I can get no satisfaction...

A escala humana

A escala humana é a medida matemática necessária ao entendimento das formas pelas quais os homens podem e devem ocupar os espaços: a volumetria. Um homem pode medir até dois metros de altura.
Ao longo da história da civilização, as obras monumentais foram e são referências arquitetônicas para a humanidade. A Acrópole em Atenas, o Coliseu em Roma e a Muralha da China entre outros. As cidades-estado, assim como os pequenos burgos eram construções horizontais. Algumas nas planícies, outras nas encostas das montanhas ou à beira dos rios, lagos e mares.
Até o inicio do século 20, vivíamos dentro da escala humana, no que se refere às formas de habitação e consumo de bens duráveis.
Porém, na medida em que a engenharia possibilitou a construção vertical, contribuiu decisivamente para os chamados aglomerados urbanos.
Na Europa, certamente por razões de conservação do patrimônio histórico e arquitetônico, a verticalização das construções não proliferou tanto quanto nas Américas e em algumas regiões da Ásia. É nítida a diferença entre Londres, Paris, Madrid ou Atenas, de um lado, e do outro, Nova York, São Paulo, Buenos Aires (em parte), Singapura, Hong Kong ou Tókio.
O fato é que com ou sem a verticalização nas construções, as cidades cresceram, algumas se tornaram metrópoles, onde a impessoalidade, a violência, o confinamento e o concreto são características marcantes.
A explosão demográfica ocorrida nos últimos cinqüenta anos, com a triplicação da população mundial foi um fator decisivo para a constituição destes núcleos hiper povoados.
Vários arquitetos, sociólogos e planejadores urbanos tentam amenizar a vida nas cidades. A revitalização urbana com animação e motivação das comunidades dos bairros das polis é a palavra de ordem.
De um lado, há um clamor generalizado pela simplicidade de viver e pelo reencontro com a natureza.
Do outro, o mercado, através da mídia, impõe novos conceitos de consumo, postura e lazer. São, por exemplo, os novos prédios verticais com áreas de uso exclusivo de até duzentos metros quadrados, com varandas e churrasqueiras onde não cabem mais do que cinco pessoas. É a chamada casa de campo no oitavo andar.
Quando nos demos conta do chamado progresso urbano ocorrido a partir da segunda metade do século 20, descobrimos que havia habitantes solitários das mega-cidades vivendo em maciços de concreto de até setenta metros de altura, quase todos em regime de confinamento espacial.Percebeu-se que estávamos fora da escala humana e que várias das neuroses, entre elas a solidão, eram decorrentes daí. A humanidade, então, passou a dormir com um desejo inconsciente: “Talvez um dia você encontre meu rosto no meio da multidão”.

Eco-Money

Há cinqüenta anos, no início da segunda metade do século XX, quando íamos às praias ainda selvagens do litoral brasileiro, dizíamos: só tem “mato” e estradas “sujas”, por serem empoeiradas ou enlameadas, dependendo dos dias ensolarados ou chuvosos. Não sabíamos, então, o que significava de fato o “mato” e a “sujeira”.
Acelera-se a urbanização do país, a indústria automotiva começa a tomar corpo, as classes média e alta querem residências de praia com jardins gramados e estradas pavimentadas, para usufruir as delícias do verão. Este era o sonho dourado dos anos sessenta e setenta para uma pequena parte dos brasileiros cujas famílias podiam tirar férias do Natal ao carnaval.
As cidades foram crescendo e produzindo o caos urbano, desde os engarrafamentos no trânsito até os assaltos à mão armada ou às balas perdidas.
Algumas pessoas procuraram o litoral para tentar uma nova proposta de vida. A questão ambiental passou a integrar a pauta do chamado mundo civilizado e as praias cercadas de “mato” e “sujeira”, incorporaram um valor monetário crescente.
Descobrimos que o “mato” era a mata atlântica e que as ruas não pavimentadas e “sujas” podiam significar tranqüilidade e paz.
O mercado imobiliário enxergou novos potes de ouro nas pontas deste arco-íris.
Paralelamente ao nascimento de uma legislação “verde”, surgiram as empresas especializadas nos licenciamentos ambientais e, consequentemente, as câmeras e prefeituras municipais passaram a sofrer diferentes pressões para consentirem na ocupação máxima do solo.
Estava criado o cenário para as operações financeiras do Eco – Money.
No início deste ano, Florianópolis – a ilha capital do estado de Santa Catarina, belíssima por suas praias e lagoas foi palco da operação deflagrada pela Policia Federal, denominada “Moeda Verde”.
Esta semana, no litoral sul fluminense, especialmente em Angra dos Reis, vemos outra operação com as mesmas características daquela.
Empresários do ramo imobiliário, vereadores, prefeitos, funcionários públicos de órgãos de licenciamento ambiental e empresas de consultoria da área verde, todos entrelaçados num processo de corrupção vendendo o que resta das reservas naturais.
Não sabem, ou pior, sabem, mas não se importam com a degradação da faixa litorânea brasileira, uma das mais aprazíveis do planeta.
Deveriam observar que a atividade turística instalada nestes pequenos paraísos naturais está diretamente relacionada à sanidade ambiental e a um modo de viver que inclui, necessariamente, formas mais orgânicas na organização social.
A ocupação sem critérios ecológicos destes valiosos enclaves na orla subtropical vai provocar cenários de “mato” e “sujeira”, aí sim, como nunca vimos antes.
E quem sobreviver, verá...

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

O jornal

A história do jornal começa, no Ocidente, com a Acta Diurna criada pelo imperador Julio César, no ano 59 antes da era cristã, para informar aos cidadãos sobre os acontecimentos políticos, sociais, escândalos, julgamentos e execuções. As Actas eram escritas em grandes placas brancas e expostas em locais públicos, como as termas de Caracala, a fim de dar ciência ao povo sobre os fatos da vida romana.
No Renascimento, em 1556, o governo de Veneza, publicou a Notizie Scritte, que custava uma moeda denominada “gazzeta”. Talvez uma forma de dar apenas uma versão aos fatos da vida renascentista.
Danton, um dos formuladores da Revolução Francesa, imprimia folhas com conteúdos revolucionários e as colava nas paredes dos prédios de Paris.
Originada na palavra francesa “jour”, que significa dia, nascia o “journal” diário.
Com o surgimento do estado moderno (1789), dividindo o poder político em três funções: executiva, legislativa e judiciária, a imprensa teria uma função primordial de fiscalização dos atos do governo, tornando-se um poder paralelo ao poder do estado. Até hoje é assim.
A imprensa tem em sua essência um poder político fundamental à organização social. Não é licito, contudo, confundir o poder político intrínseco com política partidária. Exatamente aí nasce a liberdade de imprensa, quando ela não confunde o seu conteúdo político com a expressão partidária.
No recém vivido século XX, a imprensa evoluiu para outras formas de comunicação, incorporando o rádio e a televisão ao seu arsenal de divulgação dos fatos interessantes à vida social. No início deste terceiro milênio, a Internet passa a ser mais uma forma de noticiar.
A explosão populacional e a expansão do mercado, acontecidas nos últimos cinqüenta anos, induzem às grandes tiragens e, consequentemente, ao jornal de ampla circulação. Os jornais, então, passam a vender mercadorias e serviços diversos, além das notícias.
Entretanto, recentes estudos apontam à diminuição do número de leitores destes veículos de circulação nacional. De um lado pelo avanço das novas mídias, especialmente a televisão e a Internet, e de outro, pela distância crescente entre os fatos acontecidos nas diversas comunidades da aldeia global e a publicação de assuntos nacionais ou internacionais.
O jornal de grande circulação se afasta do cotidiano da polis.
Coincidentemente ao nascimento do partido verde alemão, com seu conhecido lema: Think global, act local – pensar global, agir local – surgem os jornais regionais com a mesma finalidade.
O jornal regional também divulga os acontecimentos nacionais e internacionais, mas, principalmente, retrata os fatos da vida regional. Ele está mais próximo do cidadão, ele abre espaços para as opiniões locais, ele enfrenta e fiscaliza os poderes municipais. Ele é o reflexo político da vida das vilas. Os jornais regionais garantem a liberdade de expressão de seus leitores e funcionam como promotores da legalidade republicana por onde circulam.
Por isto, terão vida longa.