Hercilio Luz e
o Whatsapp
Marcos Bayer
Este artigo é uma homenagem ao Governador Hercílio Luz
e a sua neta, Olga Maria. Hercílio construiu a ponte que leva seu nome entre
1922 – 26, sendo que morreu na metade do trabalho. Nem por isto seu projeto foi
abandonado e sua equipe concluiu a obra. Em apenas quatro anos, com a
tecnologia disponível à época fez o monumento que representa Santa Catarina até
hoje. Apesar disto, a ponte está totalmente interditada desde 1991, portanto há
27 anos. Milhões de reais são gastos em suas obras de manutenção e reformas.
Em 1971, num domingo de Março, dia 14, meu pai faleceu
em acidente automobilístico na BR 101. No dia seguinte, Colombo Sallles tomava
posse no cargo de governador deste Estado. Não sei exatamente porque, comecei a
me interessar pela política naquela época. A missão dele era renovar as forças
políticas estaduais por determinação do regime militar. Ele, entre outras
obras, construiu a primeira ponte de concreto que leva seu nome, ligando a Ilha
ao Continente. Neste mesmo ano, tomava posse na Câmara dos Deputados, o Dr.
Jaison Barreto, médico oftalmologista formado na Faculdade Nacional do Rio de
Janeiro e com especialização na Clínica Barraquer em Barcelona.
Antonio Carlos Konder Reis sucedeu Colombo Salles, em
1975, indicado pelos militares e reinaugurou a fase política em que se
alternavam os Ramos do PSD e os Konder Bornhausen da UDN, como fora de 1946 até
1964 com o golpe militar. Aderbal Ramos da Silva foi o primeiro governador
depois da ditadura de Getúlio Vargas, foi sucedido por Irineu Bornhausen,
depois por Jorge Lacerda que quebrou a hegemonia dos dois grupos políticos. Seu
vice Heriberto Hulse concluiu o mandato em razão do acidente aéreo que tirou
sua vida e também as de Nereu Ramos e Leoberto Leal. Em 1961 Celso Ramos é
eleito governador e funda o BESC.
O Banco do Estado de Santa Catarina era um contra
ponto do PSD ao Banco Indústria e Comércio da UDN.
Celso é um grande animador da agropecuária, e pelas
mãos de Glauco Olinger e Luiz Carlos Gallotti Bayer fez-se uma revolução na
agroindústria catarinense, liderada pela Sadia e Perdigão, no sistema integrado
de produção com financiamento subsidiado do BESC. Ivo Silveira, eleito pelo
voto direto e secreto, governa o Estado numa composição PSD/UDN. Nascia a
ARENA, Aliança Renovadora Nacional, para dar suporte político aos militares.
Konder Reis, construtor de estradas, impecável no
trato da coisa pública, foi o primeiro governador a se preocupar com a
restauração do patrimônio histórico e arquitetônico. Sua sucessão foi disputada
indiretamente, em 1978, por seu primo Jorge Konder Bornhausen e Victor Fontana.
Ambos estavam inscritos na ARENA, mas Victor era do PSD, mesmo partido de seu
tio Attílio, fundador da Sociedade Anônima Concórdia, a Sadia. Com a
participação de Golbery do Couto e Silva, Jorge foi o escolhido.
Em 1975, Esperidião Amin havia sido escolhido prefeito
da Capital pelo governador Konder Reis, após consultar o PSD do Doutor Deba.
Em 1978, Antônio Carlos Vieira, o Vieirão, através de
sua influência na estrutura da Secretaria de Fazenda, elege dois deputados:
Gilson dos Santos (estadual) e Esperidião Amin (federal).
Jaison Barreto, no mesmo ano, é eleito Senador da
República pelo voto direto, numa das campanhas mais vibrantes da história
catarinense. Jaison era a voz da liberdade, da valentia, da democracia e da fraternidade.
Formou, pela postura política, inúmeros jovens. Era o que o MDB tinha de mais
autêntico. Levou como suplentes Dejandir
Dalpasquale e a lageana Maria Shirley, a primeira mulher catarinense a ocupar a
tribuna do Senado.
Foi nesta eleição que um jornalista de nome relativo à
árvore frutífera de clima temperado, em troca de cargo vitalício no Tribunal de
Contas, passa a ser o porta voz do poder. Não importa quem esteja no poder.
Jorge Bornhausen destacou-se por duas iniciativas: a
lei do pó de giz que gratificava as professoras que desejassem voltar às salas
de aula para o ofício do magistério e a construção do Centro Integrado de
Cultura - CIC, um marco na história da Capital e que graças ao fotógrafo
Gilberto Gerlach, a cidade pode assistir aos filmes que transitavam fora do
circuito comercial. Aproveito para agradecer, publicamente, ao então governador
a oportunidade de estudar nos EEUU nos anos de 1981 e 1982, autorizando meu
afastamento do serviço público.
Jorge Bornhausen, candidato ao Senado, lança
Esperidião Amin e Victor Fontana, agora pelo PDS, para o governo em eleições
diretas.
Jaison Barreto e Pedro Ivo Campos são os adversários
pelo MDB. Perderam nas urnas ou pelas urnas. Até hoje o resultado é
controvertido. Há versões distintas.
Amin enfrenta as enchentes de julho de 1983, são 200
mil desabrigados. Isenta do pagamento de ICM os empresários que não demitissem
os trabalhadores, participa das operações de resgate e ganha o respeito de
pessoas que continuaram a trabalhar. Viu que o desespero maior do ser humano é
não ter trabalho e não poder se sustentar. Nas eleições de 1998, quando foi
novamente eleito governador, recebeu de Blumenau uma votação retumbante como
forma de gratidão. Pavimentou a Serra do Rio do Rastro e instituiu o programa
agrícola chamado Troca – Troca, onde o agricultor recebe a semente e paga com o
produto cultivado, privilegiando o trabalho ao invés do capital.
Em 1984, com a exaustão do regime militar, o movimento
por eleições diretas toma conta do Brasil. Diretas Já. Amin monta o palanque em
Florianópolis. Jaison sobe nele com Ulysses Guimarães e outros. Começa a
aproximação entre ambos. O movimento empolga jovens, artistas, intelectuais e
brasileiros de todos os naipes. Incentivado pelo senador Jaison Barreto, numa
palestra no auditório do Tribunal de Contas, resolvi, por questão ética pedir
demissão no serviço público e me inscrever no PDT, na Assembleia Legislativa,
pelas mãos do governador do Rio de Janeiro, Leonel Brizola. No ano seguinte, 1985,
Brizola – Jaison – Amin, criam a AST
– Aliança Social Trabalhista para disputar a Prefeitura de Florianópolis, na
primeira eleição direta depois do fim do regime militar.
A emenda parlamentar Dante de Oliveira não passou,
houve então o Colégio Eleitoral que escolheu Tancredo Neves para a presidência
do país.
Tancredo adoeceu, não tomou posse em 15 de Março de
1985 e morreu em 21 de Abril. José Sarney, o vice, tomou posse indicado na
chapa pela Frente Liberal. A Frente Liberal foi uma dissidência do PDS,
liderada por Jorge Bornhausen, Sarney, ACM, Guilherme Palmeira, Marco Maciel e
outros nomes do cenário nacional.
Quando a AST
definiu seu candidato, Francisco de Assis, deu para perceber que a renovação
não era para valer. Muito menos com Maneca Dias de vice.
Do outro lado estavam Edison Andrino pelo MDB, Jorge
Lorenzetti pelo PT, Enio Branco pelo PFL, Vilson Rosalino pelo PCB e José
Ortiga pelo PTB.
Inconformado, criei junto com a Olga, o PDT-Livre. Eram dois cabos de vassoura,
cada um de nós segurava um, esticando uma faixa de pano branco com letras
vermelhas: PDT-Livre. Com o passar dos dias a dissidência foi aumentando,
apoiamos o Andrino até a vitória. O PFL descarregou seus votos no Edison. Acho
que o PT e o PCB também.
Como era bom fazer política por amor à arte.
Andrino achou que tivesse ganhado sozinho. Foi
engolido pelo PT. Conseguiu fazer o Terminal Cidade de Florianópolis, criou o
Polo do Vestuário por inspiração da Dona Ninita Muniz, empenhou esforços para
tombar o prédio dos Correios na Lagoa da Conceição por inspiração da Associação
Costa Leste, construiu os abrigos para as embarcações dos pescadores nativos e
retirou o lixão (aterro sanitário) que ficava ao lado do cemitério no
Itacorubí.
Em 1986, Pedro Ivo ganha as eleições para o governo e
faz dois senadores: Wedekin e Dirceu Carneiro. Pedro constrói a segunda ponte
de concreto e que levará seu nome quando inaugurada por Casildo Maldaner, seu
vice e sucessor. Maldaner em Agosto de 1989, durante 17 dias, deu a volta ao
mundo tratando de interesses de SC. Começou por Tokyo, Aomori, Nova Delhi,
Berlim Ocidental e Oriental, Praga, Paris, Madrid e Lisboa. Em Novembro daquele
ano o Muro caiu. Wedekin foi para o PDT e Dirceu Carneiro para o PSDB.
Em 1988, Andrino perdeu as eleições para Amin eleito,
Bulcão Prefeito. O PDS e o PFL estavam juntos novamente.
Chega a eleição de 1990 e o PMDB não tem candidato. Paulo
Afonso é indicado pelo Dr. Saulo Vieira, um dos fundadores do partido e seu
mais eficiente articulador. Amin se elege senador e Kleinunbing governador.
Novamente o PDS e o PFL juntos.
Em 1994, FHC é candidato à presidência e não tem um
palanque em Santa Catarina. Jorge Bornhausen que já havia sido Ministro da
Educação de José Sarney, Secretário de Governo de Fernando Collor e consolidado
sua liderança no Senado Federal, na bancada do PFL resolve disputar o governo
estadual. Amin decide disputar também a presidência, na mesma eleição em que
estavam Brizola, Lula, Quércia e Enéas.
Em Santa Catarina, quebrou-se a aliança PDS/PFL. Paulo
Afonso correu pelo PMDB, Ângela Amin pelo PPR, Jorge Bornhausen pelo PFL e
Nelson Wedekin pelo PDT. No segundo turno PMDB – PFL – PDT se juntaram e
venceram Ângela.
O governo Paulo Afonso foi marcado por uma intenção
municipalista, pelo affair das Letras do Tesouro e pelos Precatórios. Seu governo
quase foi derrubado por um processo de impeachment. Atrasou a folha de
pagamento dos salários do funcionalismo em três meses. Seus auxiliares mais próximos
não eram do velho MDB.
Em 1996, Ângela Amin se elege prefeita da Capital.
Derruba o PT, PFL, PMDB e o PSTU. A cidade nas vésperas da votação estava
repleta de bandeiras vermelhas em suas principais esquinas. Mas, a grande parte
da população permanecia em silêncio. Era a vitória esperando a hora de se
revelar. Na ocasião escrevi um artigo: Ângela Catarina, publicado no jornal
O ESTADO. Recebi um telefonema de
seu marido convidando para um café que só aconteceu três ou quatros meses
depois. Em Março de 1997, me foi proposta uma assessoria pelo senador. Achei
estranho, mas não recusei.
Em 1998, Amin e Bornhausen se reaproximam e reeditam a
aliança de 1982. FHC é reeleito. Paulo Afonso termina sua carreira política
precocemente. Depois disto, mais tarde, chegou a assessorar o vice-presidente
Temer.
Amin realizou em seu segundo mandato a iluminação da
Serra do Rio do Rastro e da Serra da Dona Francisca. Pelas mãos competentes do
Vieirão, reorganizou as contas públicas, inclusive junto ao BIRD/BID onde o Estado
estava sem crédito pela inadimplência do governo anterior. Não se podia nem
construir rodovias, pois este dinheiro faz parte de um programa específico e
que todos os governadores usam como se fosse um mérito pessoal. O programa
micro bacias é desenhado para os países subdesenvolvidos dentro da lógica de
que a rodovia escoa produção, integra as comunidades e promove o desenvolvimento.
Exatamente como foi feito no Império Romano em toda a Europa. Amin executou uma
política externa, incisiva e múltipla, ampliando as exportações de carne suína
e aves para a Rússia e Golfo Arábico. Abrigou em Santa Catarina investimentos
como a Usinor da França, a Marcegaglia da Itália e a Cebrace Vidros Planos, uma
joint
venture entre a França e o Japão. Foi o momento mais fecundo do Estado
na área externa. Foi um governo tranquilo, com Celestino Secco administrando
possíveis crises de praxe.
No ano 2000 Ângela Amin se reelegeu prefeita. Foi o
apogeu político dos Amin. A capital e o Estado estavam sob a mesma orientação
partidária.
Em 2002 Amin não se reelege por menos de meio por
cento. Começa a era Luiz Henrique da Silveira. Não se sabe ainda quais as
realizações de LHS. Mas, o metro de superfície na capital, a reforma e a
entrega da Ponte Hercílio Luz, as SDRs – Secretarias de Desenvolvimento
Regionais, denominadas de “Cabides de Emprego” por Raimundo Colombo, parecem
ter sido as mais célebres. Na ânsia de ser recebido por algum Rei, querendo
superar seu antecessor, tentou encontro com Juan Carlos da Espanha, mas não vingou.
Tentou então, o Presidente do Governo, mas também não deu certo. Acabou
jantando como o Roberto Carlos, jogador brasileiro que jogava à época no Real
Madrid. Para um país que aprecia o futebol, até que não foi tão mal assim.
Mas, o fato mais marcante foi a prisão pela Polícia
Federal de Aldo Hey Neto, em Outubro de 2006, entre as eleições de primeiro e
segundo turno. Aldinho como era chamado, consultor tributário encarregado de
soluções contábeis foi algemado dentro do Centro Administrativo e em seu apto
foram encontradas diferentes moedas, entre elas dólares e euros.
LHS concebeu o que ele chamava de La Grande Concertación,
cujo tripé político era a aliança PMDB – DEM – PSDB.
Este projeto o fez duas vezes governador e uma vez
senador. Levou Raimundo Colombo ao Senado e duas vezes ao governo. Colombo
também prometeu entregar a Ponte Hercílio Luz pronta e acabada. Fez de Paulo
Bauer senador.
O resultado de La Grande Concertación nós vimos em
2018. A primeira parte foi no primeiro turno. A segunda parte virá no próximo
domingo.
No tempo do Hercílio Luz a palavra dada valia e a
eleição era vencida no discurso político. Com o passar do tempo, a palavra do
político foi valendo cada vez menos. Até que chegamos às campanhas eleitorais
pelo whatsapp, onde podemos
verificar o que foi dito e contra dito. O que foi feito e contra feito.